quarta-feira, 17 de junho de 2009

ENTREVISTA IVAN CAPELATTO-JORNAL ESTILO CAMPINAS -JUNHO/2009

ENTREVISTA : EDUCAÇÃO E AFETIVIDADE
O médico Psicanalista clínico e Psicólogo Ivan R. Capelatto fala sobre as causas do declínio de valores morais pela sociedade atual

Por Leila de Oliveira
leila@estilocampinas.com

“O maior desejo do ser humano é ser desejado”a frase, do Psicanalista francês Jacques Lacan (1901-1981) é repleta de simbolismos e atualíssima para promover reflexões sobre linguagens e fenômenos comportamentais da atual sociedade.A opinião é do Psicólogo e Psicanalista Ivan Roberto Capelatto. Com extensa experiência clínica em psicologia infantil, adolescente e familiar, é um dos maiores especialistas no assunto Educação e Afetividade,com 4 livros publicados sobre o tema, e palestras realizadas em centros culturais e universidades.Segundo o Psicoterapeuta, discorrer sobre as causas de desvios comportamentais observados nos últimos 30 anos é abordar questões educacionais, familiares, culturais e econômicas,fatores de forte influência na vida das pessoas,cujos impactos independem de classe social. Dr. Ivan Capelatto afirma que dentre as mais importantes alterações comportamentais, está a necessidade de se conquistar e exibir poder, como forma de aceitação e mecanismos de reger relações. Este efeito seria reflexo de uma era marcada por excesso de estímulos consumistas e cultura de exibicionismo, encabeçada por celebridades e difundida pela mídia, além do fator educação , representado pela imagem de pais cada vez mais inseguros sobre seu papel com os filhos. Segundo ele, as conseqüências negativas das falhas no sistema educacional, e a falência de um modelo familiar que prioriza afeto e cuidados se refletem no aparecimento de gerações cada vez mais sujeitas aos apelos da indústria de consumo, cujo poder de criar necessidades é ilimitado.
“Essa geração busca obter poder como forma de aceitação, na escola, no trabalho, e até na família. Isso se dá através da busca pela visibilidade a qualquer custo, pela satisfação momentânea através de itens de consumo.

De seu consultório, o Dr. Ivan Capelatto concedeu a seguinte entrevista ao Jornal Estilo Campinas:


Como se revelam, na sociedade, os efeitos nocivos de uma geração que absorve cada vez mais a cultura do culto á própria imagem?

A ausência de sentimentos que denotem afetividade e cuidado com o próximo é cada vez mais comum nas relações, e cedem espaço para a busca constante por prazeres imediatos, com ênfase em riqueza, beleza, sucesso.Esse padrão de comportamento dissemina uma cultura narcisista, onde o sentimento de coletividade é anulado.Instala-se um circulo vicioso e nocivo, onde as necessidades adquirem proporções irreais.O “querer” é substituído por “ter que”e isso não tem fim, pois um prazer vai sempre suceder o outro numa velocidade onde o gosto pela conquista é suprimido, e quase sempre resulta em cobranças pela busca de um modelo imaginário de realização.

Esse modelo de comportamento é observado em alguma faixa etária ou classe social específica?

Vivenciamos a sétima geração de crianças, jovens e adultos que reproduzem o comportamento narcísico, cujas características são o egoísmo e a insensibilidade para com o outro. Essas manifestações podem ser observadas em todas as classes sociais. O que muda são os meios por onde se manifestam; mas o mote “poder” segue como fio condutor para as mais diversas –e bizarras ações.Dentro da percepção de que “eu sou mais importante” o outro perde valor, e o resultado é o aumento dos casos de intolerância as diferenças,e dos crimes sexuais e passionais.

No centro das principais causas desta transformação social, estariam as falhas do modelo educacional, inclusive por parte de pais, e no conceito de sociedade de consumo. É possível exemplificar os erros deste dois sistemas?


As mudanças no cenário econômico e social promoveram alterações também na forma de se criar os filhos, principalmente devido as dificuldades em conciliar o tempo entre trabalho, filhos e outros afazeres. Com grande parte da educação delegada a terceiros, a manutenção da afetividade, os cuidados, e mesmo limites, tão importantes durante as fases da infância, ficam comprometidos.E então, vem o sentimento de culpa, por parte dos pais, que numa atitude de compensação se tornam permissivos, desautorizados, e inseguros perante os filhos.
Dessa dinâmica surgem os “pequenos ditadores”; crianças e jovens que perdem a capacidade de sentimentos como medo e culpa; se tornam intolerantes a frustrações e adotam uma postura de autossuficiência que não é real. E então, temos os fatos que atestam a falência da afetividade, como o aumento dos casos de “Bullyng”, do conceito do sucesso a qualquer custo, mesmo que ilícito, a banalização do consumo de bebidas alcoólicas e drogas. Atos adotados, muitas vezes, apenas para ser aceito como parte do grupo, ou para se destacar dentre os demais.

Qual o caminho para se evitar o crescimento e se manter na contramão desta tendência?


Na cultura narcisista, que prega o culto a própria imagem, não há espaço para a afetividade; as relações são superficiais, de aparências,além de exigir que o indivíduo tenha que exibir algum poder.Trata-se de um jogo perverso, inclusive com efeitos negativos para os que não participam dele. Se estamos falando de uma massa cada vez mais crescente, então quem não se identifica se sente confuso, excluído, á margem.
O único meio de se deter a disseminação deste tipo de comportamento é através da educação.A dinâmica afetiva promove o auto-conhecimento e prepara a criança para os desafios de um cenário de vida real, onde alegrias, perdas e frustrações fazem parte.
Quando a criança se sente cuidada, pela figura dos pais, dos avós, do educador, ela se torna mais segura de suas escolhas e menos suscetível aos apelos e influências externas, que sempre virão.

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